LUSO-AMERICANO É O 1.º ‘MAYOR’ DA QUINTA MAIOR CIDADE NO ESTADO DE RHODE ISLAND

🖋Por HENRIQUE MANO

Quando, a 8 de Janeiro do ano passado, a meros dois meses do início da maior pandemia global dos últimos cem anos, Roberto da Silva tomou posse como primeiro presidente da câmara de East Providence, o nome do político luso-descendente entrou directamente para a história da 5.ª maior cidade do estado de Rhode Island.

“Tínhamos um gestor que era nomeado pelo Conselho Municipal e os moradores de East Providence não estavam muito satisfeitos com o rumo que a cidade estava a tomar”, conta o ‘mayor’ Roberto da Silva, em entrevista exclusiva ao jornal LUSO-AMERICANO concedida no seu gabinete de trabalho. “Acaba por haver uma alteração à carta da cidade que permite então a existência do cargo de presidente da câmara, submetido ao escrutínio popular”.

Silva, que se reformara como capitão da polícia em Pawtucket, fora deputado estadual pela Assembleia Legislativa do estado e concorrera já a senador estadual, avança com a candidatura a ‘mayor’ “depois de vários sectores da sociedade me terem incentivado a tal”.

Fachada do edifício da Câmara Municipal em East Providence, RI

É eleito com 52,1% dos 15.500 votos contados, passando a ter a seu cargo a área urbana de 43 km2, cujos primeiros habitantes recuam ao ano de 1641, na ainda colónia de Plymouth.

“Os eleitores perceberam que era necessário alguém com experiência em administração pública”, nota Roberto da Silva. “O facto de eu ter passado já pelos vários escalões dessa vivência, mostrou-se-me de suma importância para as responsabilidades que agora acarreto como presidente da câmara”.

East Providence é hoje um produto da imigração portuguesa para a região, cujo movimento arrancou no início do século passado e se arrastou até ao início da Grande Depressão, atraído pelas oportunidades de trabalho. Registos históricos indicam mesmo que, por volta de 1905, viviam já na cidade 400 portugueses. O poder do voto luso-americano manifesta-se hoje a todos os níveis.

❝OS MEUS PAIS VIERAM À PROCURA DO SONHO AMERICANO, QUERIAM UMA VIDA MELHOR PARA ELES E PARA OS FILHOS❞

Roberto da Silva, ‘mayor’ de East Providence, RI

Os Silva são açorianos – a mãe de Ponta Delgada, o pai do Nordeste. Em 1967 trocaram a ilha de São Miguel pela América, onde o futuro ‘mayor’ iria nascer – dois anos depois. “Os meus pais vieram à procura do sonho americano, queriam uma vida melhor para si e para os filhos”, afirma.

Os novos imigrantes trabalharam no sector fabril em Rhode Island e “em quatro anos compravam a sua primeira casa em Providence”, conta Roberto da Silva, que cresceu na capital do ‘Estado Oceano’ com as duas irmãs, onde também fez o secundário.

“Desde novo que queria ser polícia”, revela. Aos 24 anos veste a sua primeira farda, como agente em Pawtucket. Passam 25 anos “num abrir e fechar de olhos” e Silva, que entretanto se casa e tem dois filhos, reforma-se com a patente de capitão. Muda-se para East Providence em 1997, onde compra casa e se começa a envolver a nível comunitário. “Gosto muito da cidade e estava disposto a ajudar outros luso-descendentes em campanhas pra cargos públicos”, diz.

O ‘mayor’ Roberto da Silva com algumas das suas colaboradoras

Não tarda muito e ele próprio estava nos corredores da política. Em 2008 acaba eleito deputado estadual pelo partido democrata, ocupando a cadeira durante 4 anos na Assembleia Legislativa de Rhode Island. Ainda tenta a sorte como senador estadual, mas perde com a diferença de apenas 60 votos…

❝POR VeZES TEMOS DE TOMAR DECISÕES IMPOPULARES, MAS É PARA ISSO QUE SOMOS ELEITOS❞

Roberto da Silva, ‘mayor’ de East Providence, RI

Afastado da política, junta-se ao desporto comunitário e começa uma academia para jovens interessados em futebol, que depressa se torna numa das maiores do estado.

Como presidente da câmara, Roberto da Silva é um CEO à frente de uma máquina burocrática com mais de 400 pessoas. “Por vezes temos de tomar decisões impopulares, mas é para isso que somos eleitos”, refere. “Quando a COVID começou, por exemplo, passei uma directiva municipal que obrigava todos os moradores a usar máscara em público – antes mesmo da mesma ordem ter sido dada pela governadora. Fi-lo por uma questão de saúde pública e por saber que era importante para os nossos moradores, mas não agradou a toda a gente. São medidas pouco populares mas necessárias”.

O ‘mayor’ português assumiu o cargo em plena pandemia. “Foi uma situação muito trágica, ninguém sabia como reagir. Tínhamos as famílias a pedir auxílio em relação ao que fazer, mas mesmo as autoridades ainda não tinham respostas para muitas das questões que o novo coronavírus levantava. Foi um processo de aprendizagem para todos nós”.

❝APRENDI COM OS MEUS PAIS A SER UMA PESSOA DE PALAVRA. SEMPRE❞

Roberto da Silva, ‘mayor’ de East Providence, RI

Silva, que mantém uma relação de proximidade tanto com a governadora do estado como com os representantes locais no Congresso (“fundamental para garantir o desenvolvimento económico da região”), diz que estava ciente das obrigações que o cargo exigia, “mas nunca imaginei que me ocupasse 24 horas do dia. Quero estar acessível a toda a gente e sempre que isso me seja possível – de potenciais investidores a simples residentes”.

Diz confrontar-se muitas vezes com o difícil dilema de ter de “encontrar um equilíbrio entre as muitas prioridades públicas, sendo obrigado a optar por uma em detrimento de outra”.

Roberto da Silva diz dever aos pais muitos dos valores morais por que se rege. “Olho para eles com imensa admiração”, afirma. “Deixaram tudo o que tinham e sabiam para vir para um lugar que desconheciam, do outro lado do oceano, e ainda assim me inculcaram a ideia de que nos devemos respeitar uns aos outros, de que o trabalho árduo vale a pena e que a dicotomia família e Deus é o caminho. Tudo isto moldou a minha personalidade”.

Como filho mais velho, soube sempre falar português e serviu de muleta para os pais “quando era necessário tratar de algum assunto mais sério a nível governamental. E eu servia de intérprete, tinha 14, 15 anos. Saber que os meus pais necessitavam da minha ajuda, fez-me amadurecer depressa e aprender a noção de responsabilidade”.

Deles, provém ainda um dos valores hoje muito em falta na classe política: “Ser uma pessoa de palavra. Sempre”.