100 dias do Governo de maioria absoluta do PS

Os primeiros 100 dias do Governo de maioria absoluta do PS foram marcados pelas consequências da guerra na Ucrânia, com aumento galopante da inflação, e por crises internas na saúde, nos aeroportos e na própria equipa do executivo.

No fim de Maio, o Governo fez aprovar no parlamento em votação final global a sua proposta de Orçamento do Estado para 2022, cujo chumbo em Outubro do ano passado provocou uma crise política e a convocação de eleições legislativas antecipadas, que o PS venceu em 30 de Janeiro com maioria absoluta.

Com a guerra na Ucrânia, o Governo procedeu nesse Orçamento à actualização do cenário macroeconómico, mas mesmo assim apontou para uma previsão optimista da inflação na ordem dos 4%, partindo da convicção (partilhada com o Banco Central Europeu) de que este fenómeno seria conjuntural e que conheceria um abrandamento a partir do segundo semestre do ano. Para Junho, o Instituto Nacional de Estatística (INE) estima já uma taxa de inflação de 8,7%.

Em paralelo, os juros da dívida nacional atingem os 2,3, o valor mais alto desde Setembro de 2017, acompanhando a tendência da zona euro.

Apesar das críticas de todas as forças da oposição, o Governo e PS têm recusado qualquer aumento suplementar de salários e de pensões, sustentando a tese de que essa via contribuiria para gerar uma espiral inflacionista no país.  Em alternativa, como resposta à inflação, o Governo apostou em medidas de “mitigação” dos aumentos dos preços, sobretudo nos combustíveis, com uma descida do ISP (Imposto sobre Produtos Petrolíferos), e na concessão de apoios directos às empresas do ramo agroalimentar ou grandes consumidoras de energia. No entanto, a oposição continua a considerar insuficiente o impacto global destas medidas e denuncia a perda de poder de compra da generalidade dos cidadãos.

Além da difícil conjuntura externa económico-financeira, o Governo confrontou-se com situações de caos nos aeroportos por causa da falta de elementos do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), força de segurança que o executivo socialista prevê extinguir a prazo.

Já na saúde, vários serviços de urgência em diversos pontos do país começaram a encerrar por falta de médicos.

Estas falhas ao nível da cobertura nos serviços de urgência levaram o PSD e o Chega a pedir a demissão da ministra Marta Temido, enquanto Bloco e PCP protestaram contra a falta de investimento do Governo no Serviço Nacional de Saúde (SNS).

Já na semana passada, aconteceu talvez o mais grave problema interno nas equipas governativas formadas por António Costa desde novembro de 2015. No passado dia 29, a dois dias do início do congresso do PSD, que marcou a entrada em funções do novo presidente Luís Montenegro, o ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, fez publicar por via de um seu secretário de Estado um despacho sobre a futura solução aeroportuária para a região de Lisboa sem aparente conhecimento do primeiro-ministro, que se encontrava na cimeira da NATO em Madrid.

Nessa mesma noite, Pedro Nuno Santos assumiu as soluções de construção imediata do aeroporto do Montijo e mais tarde do aeroporto de Alcochete. Mas Pedro Nuno Santos foi ainda mais longe: Contrariou frontalmente a posição de António Costa, segundo a qual esta matéria requer um consenso com o maior partido da oposição, e assumiu que o Presidente da República não tinha sido consultado sobre essa solução.

Na manhã seguinte, antes de regressar a Lisboa, o primeiro-ministro determinou ao ministro que revogasse o seu despacho e reiterou que a solução do aeroporto deveria partir de um consenso com o PSD, acrescentando, ainda, que se trata de uma matéria em relação à qual o Presidente da República tem de ser informado.

Face ao teor da posição de António Costa, a generalidade dos observadores políticos antecipou que este caso terminaria com a demissão do ministro, mas isso não aconteceu.