CRISE POLÍTICA: Governo derrubado ao fim de 10 meses

O chumbo da moção de confiança ao Governo pela Assembleia da República deixa o executivo em gestão, limitado aos actos estritamente necessários ou inadiáveis à continuação da sua actividade.
A “não aprovação de uma moção de confiança” está entre as circunstâncias que implicam a demissão do Governo, no artigo 195.º da Constituição da República Portuguesa.
O artigo 186.º da lei fundamental determina, por seu turno, que, após a sua demissão, “o Governo limitar-se-á à prática dos actos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos”.
O alcance desta norma constitucional tem, contudo, uma larga amplitude, que levou o Tribunal Constitucional, em 2002, a produzir um acórdão para explicitar as limitações dos executivos em gestão, uma vez que não há outra lei que concretize o que são os “actos estritamente necessários” à condução dos negócios públicos.
Na decisão, os juízes do palácio Ratton consideraram que um governo demissionário não tem “nenhuma limitação” nos actos que pratica, apenas tem de justificar a sua necessidade.
O “critério decisivo” que baliza os actos de um governo demissionário é, segundo o TC, o da “estrita necessidade da sua prática”, ou seja, algo que se torne “inadiável” ou absolutamente necessário à gestão pública.
O acórdão foi produzido após o então Presidente da República, Jorge Sampaio, ter pedido ao TC para esclarecer se o executivo liderado por António Guterres, que já se encontrava demissionário em 2002, poderia aprovar um decreto-lei que estabelecia o regime jurídico aplicável à gestão dos hospitais e dos centros de saúde.
Com a demissão formal do Governo socialista, formalizada através da assinatura do decreto do Presidente da República, o executivo estará em gestão até à aprovação do programa do próximo Governo pela Assembleia da República saída das eleições legislativas antecipadas, que Marcelo Rebelo de Sousa já admitiu serem marcadas para meados de Maio.

GOVERNO ADMITIU RETIRAR MOÇÃO

O ministro dos Assuntos Parlamentares admitiu ontem retirar a moção de confiança caso o PS aceitasse a realização de uma comissão de inquérito à Spinumviva em 15 dias, mas o PS rejeitou.
No debate da moção de confiança ao Governo na Assembleia da República, Pedro Duarte disse que o Governo aceitaria a comissão de inquérito à empresa familiar do primeiro-ministro, Spinumviva, o âmbito e objectivo já definidos.
Pedro Duarte defendeu que teria de haver um compromisso para que a comissão parlamentar de inquérito (CPI) apresentasse “em 15 dias resultados e conclusões” e não em 90 dias, como propôs o PS.
“É uma proposta construtiva, que permite o esclarecimento desejado por aqueles que tanto o reclamam, e que impede que o país seja enlameado e arrastado para um processo que nos vai prejudicar a todos enquanto portugueses”, disse.
O secretário-geral do PS respondeu ao ministro Pedro Duarte que os socialistas não aceitam “nem combinações, nem negociatas com o PSD ou o Governo”.