DE VILA FRANCA DO DEÃO PARA DANBURY: A TRAJECTÓRIA DE VIDA DO EMPRESÁRIO E LÍDER ASSOCIATIVO JOE BOA

Por HENRIQUE MANO | Jornal LUSO-AMERICANO

A saga de vida e emigração de Joe Boa cruza três continentes. Começa numa pacata terra do interior de Portugal, alarga-se à vastidão africana da ex-colónia de Angola e continua na grandiosa América de todas as oportunidades. Aqui se formou e fez-se homem e empresário de sucesso, sempre com o toque de simplicidade que lhe molda o carácter.

“Os meus pais vieram para a América já em idade adulta avançada [Artur tinha 52 e Joaquina 45] e nunca aprenderam inglês”, conta Joe Boa, na entrevista exclusiva que concedeu ao jornal LUSO-AMERICANO. “Sempre convivemos no meio comunitário e sinto orgulho em ser português, em manter as nossas tradições”.

Os Boa chegaram à América em 1968, tinha Joe 14 anos; estavam em Angola quando um familiar lhes enviou a carta de chamada. “O meu tio Elísio, casado com a tia Regina, foi o primeiro Boa a vir para Danbury”, nota. Para trás ficava a vivência em África, que se prolongou de 1956 a 1967. “Ainda estivemos dois meses em Portugal com a família e depois viemos para a América”.

❝SEMPRE CONVIVEMOS NO MEIO COMUNITÁRIO E SINTO ORGULHO EM SER PORTUGUÊS, EM MANTER AS NOSSAS TRADIÇÕES❞

➔Joe Boa, empresário e figura

associativa em Danbury, CT

Joe Boa em 1977, no ano em que se graduou pelo Liceu de Danbury, CT

Os Boa trouxeram os dois filhos para Danbury, José (Joe) e Horácio (Ray); Joe nasceu em Vila Franca do Deão, uma freguesia do concelho da Guarda, e acabaria por fazer o liceu em Danbury, em 1972, formando-se posteriormente em gestão de empresas pela Western Connecticut State University, em 1976. Nem tudo, todavia, a  princípio, foram rosas… “A adaptação foi muito difícil”, reconhece. “Nós não falávamos inglês e passámos o nosso primeiro verão americano sem termos conhecimentos nem amigos”.

Com a determinação com que se fazem as grandes histórias de imigrantes por terras do ‘Uncle Sam’, Joe Boa abre a primeira empresa em 1980, quatro anos depois de se ter casado com Maria Boa – uma imigrante lisboeta com raízes em Freixo da Serra; mantém a Diversified Maintenance Corporation até 2000, altura em que a vende à One Source Corp. . Presentemente, comanda a DMC Property Management, que garante a gestão de uma propriedade imobiliária na movimentada Federal Road de Danbury, a compreender quatro imóveis e 48 mil pés quadrados de área para exploração comercial. “Comprei o primeiro edifício aqui em 1984 e depois fomos construindo e aumentando o nosso portfólio”, diz. “Nunca planeei os meus negócios a pensar nas grandezas. Sempre considerei que investir no sector imobiliário me permitia um controlo mais apertado sobre os negócios e foi aí que fomos investindo pouco a pouco, conforme as coisas se foram proporcionando”.

❝NUNCA COMPREI NADA SEM SABER SE TINHA AS CONDIÇÕES PARA CONSEGUIR PAGAR NO FUTURO❞

➔Joe Boa, empresário e figura

associativa em Danbury, CT

Deixa como dica a quem interessar possa: “Arriscar é importante, mas fui sempre defensor do risco calculado. Nunca comprei nada sem saber se tinha as condições para conseguir pagar no futuro”.

Figura respeitada tanto no âmbito associativo como na meio americano, o empresário beirão pertence à Greater Danbury Chamber of Commerce e integra o conselho consultivo do ‘Savings Bank of Danbury’. A acção positiva que desempenha nesses dois quadrantes também o levou a receber o ‘American Dream Award’, atribuído em 2007 pela Greater Danbury Bar Association, e o ‘Good Scout Award’, dois anos depois, a cargo do Connecticut Yankee Council.

A ligação à vida associativa lusa desperta cedo; aos 16 anos já era sócio do Portuguese-American Club. “Vivíamos na mesma rua”, explica. Era o começo de uma longa folha de serviços à comunidade: viria a ser presidente do Clube ‘Filhos de Portugal’ e a liderar o respectivo fundo de bolsas de estudo, passando mais tarde a ocupar cargo semelhante nos esforços de angariação de capital para o fundo imobiliário do Centro Cultural Português – que nasceria da fusão daquelas duas colectividades. Faz também parte do Conselho Económico da Igreja do Imaculado Coração de Maria e foi crucial para a obtenção da hipoteca de 2,5 milhões concedida por uma unidade bancária local ao Centro.

❝CREIO TER CONTRIBUÍDO DE FORMA POSITIVA PARA A AFIRMAÇÃO E O CRESCIMENTO DA COMUNIDADE PORTUGUESA DE DANBURY❞

➔Joe Boa, empresário e figura

associativa em Danbury, CT

Com a modéstia que se lhe conhece, conclui: “Creio ter contribuído de forma positiva para a afirmação e o crescimento da comunidade portuguesa de Danbury, assim como para a sua integração no meio americano, onde gozamos hoje de uma imagem muito positiva. Os portugueses têm muito peso económico na cidade e por vezes são um tanto subestimados.”

Em retrospectiva, terão os pais dado o passo certo ao atravessarem o Atlântico? “Decididamente”, retorque. “Para mim não há país como os Estados Unidos e penso que só pode apreciar o valor desta nação quem já viveu noutras partes do mundo e tem por isso termos de comparação. Apesar de todas as suas imperfeições, não me vejo a viver em nenhum outro lado do globo”.

Com a esposa Maria Boa

Joe Boa procura transmitir às filhas e aos netos o orgulho que transporta no ADN. A filha mais nova, Paula, fez a escolaridade completa na ‘Manuel Cipriano’, andou no rancho folclórico e é advogada em Danbury. “A minha família é a minha alegria maior”, nota, referindo-se ainda à filha mais velha, Cristina, e ao genro português, Jorge Sousa, casado com Paula, “que trato como um filho e que me deu já dois netos”.

O elo de ligação à terra de origem mantém-se vincado. Quando os pais (que regressaram a Portugal) estavam vivos, “ía lá três vezes por ano. Viviam em Freixo da Serra, perto de Gouveia”, adianta. “Depois de terem falecido, começámos a ir uma vez por ano. Infelizmente, com a pandemia, não pudemos ir este ano e nem sei, agora, quando lá poderemos voltar.”