EXCLUSIVO: Na hora da despedida, xerife Armando Fontoura reflecte sobre longa e histórica carreira de serviço público
• Por HENRIQUE MANO | News Editor
Considerado o decano dos políticos de origem portuguesa no estado de New Jersey, Armando Fontoura foi, até 31 de Dezembro de 2024, xerife do condado de Essex. Nomeado para o cargo em 1990 e eleito no ano seguinte, tornar-se-ia no xerife que mais tempo esteve em funções na história do condado. E das figuras públicas do “Estado Jardim” que mais presidentes americanos conheceu (de Ronald Reagan a Donald Trump, e todos entre eles). Nada mau para o menino que, aos 12 anos, deixou Vilar de Perdizes, na longínqua Trás-os-Montes, a caminho da América das oportunidades.
Na sua última entrevista à imprensa portuguesa, enquanto xerife, dada ao nosso jornal, Armando Fontoura recorre ao humor que o caracteriza para lembrar que nasceu há 81 anos “no dia 25 de Abril. Ou seja, há um feriado em Portugal em minha homenagem”.
Foto: JORNAL LUSO-AMERICANO | O português Armando Fontoura deixa marca difícil de apagar no aparato de segurança do condado de Essex, em New Jersey – onde foi o xerife que mais tempo ocupou o lugar
Ironia à parte, o incomparável Fontoura distancia-se de lugares na história mas não abdica do seu legado. Que quer mesmo que esteja ligado “ao meu trabalho como servidor público. Tratei sempre a comunidade e as pessoas com dignidade e respeito e sinto que também recebi o mesmo de todos”.
A isto, junte-se “aquilo que conseguimos através do nosso trabalho na Essex County Sheriff’s Office, que é hoje reconhecida como uma das melhores polícias de New Jersey e até mesmo do país. É muito gratificante para mim ter conseguido isso, o que se traduziu em mais e melhores serviços para os moradores do condado de Essex”.
Foto: JORNAL LUSO-AMERICANO | Armando Fontoura vai ser substituído pelo subxerife Amir Jones, à sua direita
Formado pela Academia Nacional do FBI, Armando Fontoura começou carreira na Polícia de Newark em 1967, tendo de lá saído com a patente de capitão. Paralelamente à carreira nas forças de segurança, foi fundamental para a criação do agora inactivo Portuguese-American Congress (PAC), “através do qual demos o primeiro sinal à sociedade americana de que estávamos também interessados, como portugueses, em ser parte integrante deste país e a ocupar cargos públicos. Só nos faltavam as oportunidades. Exigimos isso, fui o 1.º presidente do PAC e começámos a inscrever pessoas para se naturalizarem e para votarem, a demonstrar o nosso poder. O partido democrata foi o primeiro a ver isso e a apostar em nós, na altura. Hoje tenho muito orgulho de todos os nossos luso-eleitos”.
Graças ao facto de sua mãe ter nascido em New Bedford, MA, e mais tarde regressado a Portugal, os Fontoura puderam emigrar para os Estados Unidos. Instalaram-se no 1.º andar do 83 da McWorther Street, em pleno Ironbound. “Tínhamos água quente, TV… pensei: isto é óptimo”, conta, rebuscando memórias de infância. Mas nem tudo foram rosas… “Andei na Lafayette Street School, no início foi difícil. Chegava a casa e chorava. O meu pai um dia disse-me: ‘Olha, pára de chorar! Não vamos voltar, aprende o inglês que é aqui que nós vamos viver’. E eu dei-lhe ouvidos. Assimilei o sotaque para que os alunos americanos não gozassem comigo e, seis meses depois, falava inglês quase tão bem como eles”.
Foto: JORNAL LUSO-AMERICANO | Num evento privado esta semana, o Vereador Michael Silva entregou ao xerife Armando Fontoura uma placa em reconhecimento à sua extraordinária carreira de serviço público; à esquerda, vê-se o empresário António Seabra
Pai de três filhas (uma delas na alta cúpula da revista de música mais conhecida do mundo, a “Rolling Stone”), este homem de convicções fortes mantém com Portugal uma relação equidistante. Esteve lá pela última vez em 2001, mas ressalva: “Costumava ir todos os anos, quando os meus pais lá viviam, em Braga”, diz o adepto do F.C. Porto, que, para atenuar as saudades, se desforra nos restaurantes portugueses do Ironbound…
Fontoura faz questão que se saiba que, apesar da retirada da vida pública, não se vai afastar da comunidade. “O Governor [Phil Murphy], o administrador-executivo do condado [Joseph N. DiVincenzo Jr.], ninguém quer que eu desapareça. Vou estar aqui e à mesa das decisões”.
Confessa ter ofertas de emprego do sector privado, mas o bichinho do serviço público fala mais alto… “Quero ficar por aqui e continuar a dar a minha contribuição”.
Afasta-se com a certeza de que não faltará continuidade. Cita o vereador Michael Silva, de Newark, como possível sucessor na esfera de influências políticas. E acrescenta: “Temos políticos em Elizabeth, temos ‘mayor’s e vereadores”.
Leva a comunidade lusa no coração. Diz-se “muito agradecido pelo apoio que dela sempre recebi. Nunca, nunca me esquecerei”.
Sobre os ventos de mudança que por aí vão soprar, aposta no optimismo: “Este país vai sobreviver e nós vamos ficar bem. Tenho a certeza de que cabeças frias vão prevalecer, vamos todos ter calma. Temos uma nova administração e vamos ter esperança e pedir a Deus que seja bem sucedida e de que todos vamos prosperar e continuar a ser o farol do mundo”.