NONAGENÁRIA NA FLÓRIDA ESPEROU MAIS DE UM ANO PARA CONHECER A TRINETA EM NEW JERSEY – POR CAUSA DA COVID
Por HENRIQUE MANO | Jornal LUSO-AMERICANO
Nem sempre a vida tem sorrido a Natália Pinho Fernandes. Em 2012, a morte levou-lhe o marido, José Fernandes (com quem estava casada desde 1949) e uma filha num doloroso intervalo de 6 meses; três anos depois, perde também o filho, vítima de um ataque cardíaco. Hoje, aos 91 anos e a viver em Port St. Lucie, no estado norte-americano da Flórida, desfruta da companhia da filha que lhe resta, Lisa, apegou-se a um cãozinho Maltese que o isolamento da COVID lhe trouxe e considera-se “abençoada” por ter 6 netos, 7 bisnetos e a segunda trineta a caminho.
“Sou uma pessoa muito realista”, avisa Natália Fernandes, na entrevista que concedeu ao jornal LUSO-AMERICANO. “A vida tem-me proporcionado bons e maus momentos e eu tenho aceitado tudo o que vem, com a compreensão de que há coisas que estão fora do nosso controlo. Deus levou-me dois filhos e não há nada que eu pudesse ter feito para o evitar. É certo que a vida muda quando nos falta alguém que é muito querido, mas a vida tem de continuar e a gente aceitar o que vem. É o que tenho feito.”
A sua vida tem os contornos de um argumento cinematográfico, onde o destino vai intervindo com frequência. Foi a única filha americana de um casal de emigrantes da Murtosa, apesar de ter sido concebida em Portugal… Os pais emigram pela primeira vez em 1920, escolhendo o Ironbound, na cidade de Newark, para viver. Resolvem-se pelo retorno à terra-mãe e é quando a mãe engravida de Natália que os Pinho voltam à América. “A minha mãe terá tido ao meu pai: ‘Os nossos filhos nasceram todos em Portugal, mas esta criança terá de ser americana.’ Metem-se no navio Saturnia e voltam. A minha mãe vinha grávida de 5 meses e passou a viagem toda com enjoos…”.
Natália, a filha americana, nasce a 17 de Julho de 1930, em Carteret. Mas os Pinho fazem vida no Ironbound – “cresci na Ferry Street” – onde ela se mantém até 1960, aí fazendo as escolas públicas. Depois de ida dos filhos para o ensino, arranja emprego numa fábrica de aparelhos electrónicos e mais tarde trabalha para os distritos escolares em East Brunswick e Bayville, ainda no ‘Estado Jardim’.
Ao mudar-de para a Flórida, opta por manter-se activa e junta-se à vida associativa. “Já perdi a conta dos anos em que me tornei secretária do clube português aqui em Port St. Lucie”, diz. Com a COVID, continua a ajudar, “mas faço quase tudo de casa.”
Natália Fernandes levou sempre muito a sério a pandemia. Por indicação do seu médico – “foi mesmo ele quem me fez a marcação para a toma da vacina” – é vacinada a 6 de Abril e leva a segunda dose a 27, do ano passado. “O meu médico explicou-me que, com a minha idade, se apanhasse COVID e estivesse vacinada, teria 95% de chances de sobreviver. Caso contrário, poderia enfrentar uma situação nem mais delicada.”
A filha com quem vive também se vacinou e Natália esteve mais de um ano sem ir ao clube português, “não queria contacto com ninguém. Afinal, com a minha idade, tive que tomar todas as precauções. Só fazia compras de manhã, quando estava menos pessoas nos supermercados.”
A nonagenária lembra que a COVID não é uma questão política, mas sim de saúde pública, que requere a contribuição de todos. “Quem não se vacina está a ser egoísta e a prejudicar a sociedade em geral”, alerta. “Vacinem-se, pensem nos vossos amigos, nos colegas, nos familiares com quem lidam todos os dias. Isto não é nenhuma brincadeira, é um assunto muito sério.”
Natália Fernandes também prefere adiar as férias a Portugal para quando o número de casos baixar; conta que nem ao baptizado na trineta em New Jersey foi, tendo esperado mais de um ano para a conhecer – “e só o fiz depois de estar vacinada.”
Encara sempre “com coragem” aquilo que o destino lhe põe no caminho. “Aceitamos o que nos vem e vamos andando, até chegar ‘aquele’ dia e é só.”