Sergei Lavrov, ministro dos negócios estrangeiros da Rússia, falou com a BBC

“Nós não invadimos a Ucrânia”. O ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, de 72 anos e com 18 de serviço no Governo russo, não se desviou da rota traçada pelo Kremlin na mais recente entrevista à BBC, antes reforçou a narrativa que vem sendo utilizada há meses para justificar a invasão: “Declarámos uma operação militar especial porque não tínhamos absolutamente nenhuma outra maneira de explicar ao Ocidente que arrastar a Ucrânia para a NATO era um acto criminoso”.

A Ucrânia não estava a caminho da aliança militar quando a Rússia invadiu o país, não faltam declarações contrárias a essa adesão por parte de vários dos mais importantes líderes da NATO. Logo no início de Março, o próprio Presidente, Volodymyr Zelensky disse que essa caminho estava vedado à Ucrânia e ofereceu-se para negociar com a Rússia nessa base.

Nenhum progresso nas negociações aconteceu e as conversações têm estado congeladas desde então, publicamente pelo menos. Um outro tema que Lavrov não deixou de referir foi o problema da propagação de ideias nazis na Ucrânia, mas Steve Rosenberg, o editor de assuntos russos da BBC, estava preparado. Citou um relatório oficial das Nações Unidas sobre a vila ucraniana de Yahidne, na região de Chernihiv, onde, segundo os investigadores da ONU, 360 moradores, incluindo 74 crianças e cinco pessoas com deficiência, foram forçados pelas tropas russas a permanecer por 28 dias na garagem de uma escola. “Não havia casa de banho, água… 10 idosos morreram. É isso que é lutar contra nazis”, perguntou Rosenberg. Mas Lavrov descartou a denúncia da ONU: “notícias falsas propaladas pelo Ocidente”.

Ao mesmo tempo que acusa as instituições internacionais de serem parte da guerra de informação falsa contra a Rússia, assume que o seu país não é sempre um exemplo. “A Rússia não é totalmente limpinha. A Rússia é o que é. E não temos vergonha de mostrar o que somos.” As críticas ao Ocidente representaram uma boa parte da entrevista e, sendo a BBC uma cadeia britânica, Rosenberg quis saber como é que Lavrov, membro do Conselho de Segurança da Rússia, directamente envolvido na decisão da invasão da Ucrânia, e alvo de parte das sanções impostas pelo Governo britânico, vê as relações entre os dois países. “Não me parece sequer que ainda exista qualquer margem de manobra. Porque tanto Boris Johnson como Liz Truss dizem abertamente que é preciso derrotar a Rússia, deixar a Rússia de joelhos. Então vá, façam-no!”, respondeu.

A questão dos dois homens britânicos acusados de “mercenarismo” e condenados à morte pela província separatista de Donestk também foi abordada mas Lavrov disse não estar preocupado com o que o Ocidente pensa dos actos da Rússia, “apenas com o que diz a lei internacional e a lei internacional não reconhece os mercenários como combatentes”.

As famílias dos dois homens alegam que eles estavam integrados nas forças armadas oficiais da Ucrânia, não sendo mercenários, e, se for esse o caso, estão abrangidos pela Convenção de Genebra que protege os prisioneiros de guerra.

As acusações estenderam-se também aos jornalistas da BBC, por não terem investigado a morte de civis nas regiões separatistas da Ucrânia “bombardeados já há oito anos pelas tropas de Kiev”. Rosenberg respondeu que tentou, nos últimos seis anos, visitar as áreas, entrar em contacto com as lideranças separatistas locais mas a sua equipa nunca terá recebido permissão para entrar.

O jornalista perguntou por que razão jornalistas ocidentais são impedidos de entrar no Donbas, uma vez que seria do interesse das lideranças separatistas a divulgação dos crimes de guerra que dizem ter sido praticados pelos ucranianos. “Não sei”, disse Lavrov.