Solidão – Próxima batalha da emigração portuguesa nos Estados Unidos
O envelhecimento da população portuguesa e luso-americana será um dos grandes desafios das próximas duas décadas nos Estados Unidos.
O fenómeno está a ser abordado com alguma preocupação por organizações portuguesas nos Estados Unidos mas não sido base de discussão pública e não se compreende bem porquê. Mesmo ao nível de paróquias a questão da solidão e da terceira idade têm passado ao lado das questões de fundo.
Num velho edifício da Magazine Street, mora Maria, natural de Aveiro. Tem 82 anos de idade e está viúva há 12 anos. Maria teve uma vida de sacrifício, muito trabalho e dois filhos que criou e educou.
“Sei lá como. Foi muito difícil por causa do trabalho. O meu marido trabalhava no porto e eu numa fábrica em Elizabeth. Tive de fazer das tripas coração para conciliar horários e tarefas.” confessa com olhar perdido mas resignado.
Maria está só. Vai à missa todos os domingos e vale-lhe a vizinha que a visita todos os dias. A filha leva-a à Igreja e vai buscá-la. O filho vive no estado de New York e visita-a uma vez por mês.
“Não é que eles não queiram. Não podem, têm o seu trabalho e eu não quero sair daqui. Tenho a igreja, o supermercado e os médicos aqui ao pé. Não quero ir viver com eles. Vivo comigo e com os meus pensamentos na minha casa enquanto poder,” diz.
Maria é uma das muitas portuguesas e portugueses que vivem sozinhos na comunidade portuguesa de Newark. A população envelheceu, não se renovou e o que lhe resta são anos de isolamento e solidão.
Em Newark, 75% da população portuguesa deve ter 65 anos ou mais. O parâmetro não é diferente noutras comunidades como em New Bedford por exemplo. Nesta comunidade existe o Centro de Assistência ao Emigrante, “uma dádiva de Deus,” dizem alguns, quando se referem ao projecto dirigido por Helena Silva, uma madeirense que há mais de 30 anos trabalha no centro. É actualmente Directora Executiva e a sua equipa faz das tripas coração para alimentar um projecto social sem precedentes.
“Criámos agora um programa chamado “Day Care” e damos apoio a idosos que nos procuram. Vêm aqui bordar, fazer crochet, aprender inglês e fazer perguntas. Muita perguntas, sobretudo quando recebem cartas. Falam pouco inglês e é aqui que obtem as respostas,” refere Helena Silva ao Luso Americano.
“Muitos sentem-se sós. Os filhos procuraram outras paragens e eles não querem sair da comunidade É uma luta diária, mas há na verdade muita solidão.” refere.
Maria, a portuguesa de Newark, nunca precisou de aprender inglês. Na Ferry Street toda a gente falava português quando veio há 50 anos. Muitos dos amigos e conhecidos eram gente de Aveiro que conhecia bem. “Era como estar lá,” confessa. Mas entretanto uns foram morrendo, outros mudaram de cidade e foram com os filhos para fora de Newark e ficaram poucos por aqui,” diz.
A realidade dos homens é diferente das mulheres. Os maridos morrem mais cedo e as mulheres passam ainda cedo a enfrentar a dureza da solidão. Sentem-se bem dutante os primeiros anos até que as primeiras doenças batem à porta.
“Tenho artrites e já tive um AVC mas felizmente cá vou andando como Deus quer,” adianta Maria resignada.
Em New Bedford, o Centro de Assistência ao Emigrante recebe cerca de 170 emigrantes seniores uma vez por mês. “Precisam de apoio e ajuda mas na verdade o que precisam é de companhia,” diz Helena Silva que considera a população idosa da sua região “a mais vulnerável por se encontrar entre duas gerações, que por muitas razões abandonam os idosos à sua sorte.”
Newark não tem um Centro de Assistência ao Emigrante e devia ter. Ainda que a Associação Cívica Augusto Amador faça alguma coisa, não tem infarestruturas para funcionar com o Centro de Assitência ao Emigrante de New Bedford. Este Centro recebe os emigrantes no seu segundo andar todos os dias das 8.30 am às 4 da tarde e vive de alguns apoios e de duas festas anuais de angariação de fundos.
As comunidades são solidárias e apoiam quem precisa, mas temos assistido a tantas festas de angariação de fundos para obras nas vilas e aldeias portuguesas que gostariamos de ver alguém angariar fundos para um Centro de Assistência ao Emigrante em Newark a pensar nos idosos, nos solitários e nas pessoas deprimidas e tristes que vivem nas nossas comunidades.
Chegou esse momento e alguém vai ter de abrir a porta à solidão e ao futuro, porque infelizmente o nosso futuro não é tão brilhente como isso. Está no horizonte a melancolia e a pouca esperança.